Chile, a alegria já vem! Esse
poderia ser o principal nome do quarto longa do diretor Pablo Larraín (Fuga,
Tony Manero, Post-Mortem [filme comentado aqui no blog]). No, vem sendo muito
elogiado pela crítica e ganhou diversos prêmios internacionais como a quinzena
de Cannes. Além disso, é o primeiro filme chileno a concorrer ao
Oscar de melhor filme estrangeiro.
René Saavedra (Gael García
Bernal) trabalha em uma agência de publicidade, cujo dono é Lucho (Alfredo
Castro), entusiasta do governo Pinochet. Quanto o governo decide instaurar um plebiscito
pela continuidade ou saída de Pinochet e dos militares do poder, em resposta às
pressões internacionais, Saavedra é chamado para fazer parte da campanha pelo “Não”,
defendendo a volta da democracia e saída dos militares do poder. Lucho, por sua
vez, muito próximo ao Ministério da Comunicação, acaba tornando-se líder da
campanha publicitária em favor do “sim”, ou seja, pela permanência de Pinochet
como presidente do Chile.
O problema é que tanto René
quanto Lucho sofrem com problemas semelhantes em ambas as campanhas. Os muitos
partidos de esquerda envolvidos na campanha do “Não” ansiavam denunciar na
propaganda diária de 15 minutos as violações aos direitos humanos cometidos
pelos militares (o que na prática fomentaria medo às pessoas em comparecerem as
urnas para votar contra o governo). Por outro lado, o Ministério de Comunicação
subestimava a capacidade de articulação da esquerda e considerava suficiente
uma campanha televisiva que mostrasse a prosperidade econômica conquistada na
era Pinochet. René enfrentará diversos desafios para levar ao ar uma propaganda
leve, para fomentar esperança e conduzir os indecisos e os que temem retaliações
do governo às urnas para votar no “não”, enquanto Lucho fará o possível para
convencer o governo do perigo e eficácia da publicidade adversária. Some a toda
essa situação, um aparelho repressivo de Estado que continua operando no
sentido de intimidar a oposição.
O filme tenta retratar de maneira
realista o drama que permeou a campanha pelo “não” de 1988. Essa opção pelo “realismo”
é visível até mesmo no tipo de câmera usada na produção do filme, que é
condizente com as usadas na década de 1980. Desse modo, a esquerda é retratada
como uma colcha de retalhos onde os muitos partidos estão vivendo um misto de
rancor e medo pelas atrocidades cometidas nos anos de governo Pinochet. Os
militares, por sua vez, tentam intimidar a oposição por meio de perseguições,
ligações anônimas, ameaças, mas uma certa letargia permeia as ações, como se os
militares não acreditassem que a campanha do “não” teria sucesso. Tanto René
quanto Lucho tentam vencer os sentimentos políticos envolvidos e fortemente
polarizados para tentar angariar de maneira objetiva os votos da população. Ao
final, o que temos é um filme muito realista e convincente sobre o processo de
derrubada do regime militar no Chile e de um processo mais silencioso, que tem
a ver com a produção de sentido e cultura pelos profissionais da comunicação
com um pragmatismo de mercado. É um filme sobre a queda da ditadura, mas também
um filme sobre publicidade e publicitários na política. Assim, “No” continua
seguindo a linha dos filmes de Larraín no sentido de mostrar diversos lados que
compõem um determinado evento, mesmo sob o ponto de vista de pessoas comuns ou
aparentemente menos engajadas politicamente.
Nota: 10,0