Não adianta,
os chilenos sabem fazer (bons) filmes sobre o momento mais dramático de sua
história recente. Bastante provocativo, Post Mortem, dirigido por Pablo
Larraín, foi, e está sendo, muito aplaudido pela crítica mundial tendo
conquistado prêmios nos Festivais de Veneza, Guadalajara, Antofagasta e outros.
É um filme muito interessante para nós brasileiros que atravessamos tempos de
“Comissões da Verdade”, espaço que infelizmente parece privilegiar a elucidação
das mortes e desaparecimentos de militantes de esquerda, esquecendo-se de
pessoas comuns (populações rurais, índios e etc.) que ignoravam ou desconheciam
a existência do comunismo ou do mundo bipolar, e também sofreram ou desapareceram
em conseqüência do regime militar.
Mario (Alfredo
Castro) trabalha como escrivão e auxiliar numa espécie de Instituto Médico
Legal e é apaixonado por sua vizinha, Nancy (Antonia Zegers), que trabalha em
um cabaré e mantém relacionamento liberal com um jovem militante de esquerda,
que, por sua vez, usa a casa de Nancy como ponto de encontros da militância.
Mario e Nancy são pessoas distantes dos acontecimentos políticos que
tumultuavam Santiago no momento pré-golpe. Mario, em especial, sente-se
deslocado (para não dizer enojado) quando o tema em sua roda de colegas é
política. Nancy, por sua vez, detestava os encontros políticos realizados em
sua casa. No entanto, certo dia Mario é surpreendido pelo som de tumulto na sua
rua. Descobre que a casa de Nancy foi revirada e a mesma está desaparecida. É o
início de sua busca por Nancy em meio a uma cidade vazia e desolada e um IML
lotado de corpos que não param de chegar em caminhões militares.
O evento do
golpe militar praticamente não existe para os protagonistas, a não ser pelas
suas conseqüências, sublinhando uma vez mais o quanto a política estava
distante do universo dessas pessoas. O desaparecimento de Nancy, a cidade
desolada, os muitos corpos espalhados pelos corredores do IML, a autópsia no
corpo do presidente Salvador Allende, são algumas das conseqüências que trazem
sofrimento e aflição para os personagens. Enquanto uns se desesperavam e
enlouqueciam com a situação, outros muitos, como Mario, utilizavam da alienação
como meio de sobrevivência buscando ignorar ao máximo a “chuva” de corpos no
IML, incorporando e tornando verdadeira a frase sou funcionário e somente
faço meu trabalho.
Esse filme
pode ser considerado uma obra-prima, tanto quanto uma pedrada na cabeça.
Difícil não sair perturbado ou pensativo após assisti-lo. Mario é um personagem
frio, solitário e com sérios problemas afetivos. Essa condição abre outra
possibilidade de análise sobre o filme, mas prefiro deixar no ar para que vocês
mesmos tirem a conclusão. É um filme para fazer pensar. Não espere por uma
linda trilha sonora, pois o filme não tem musica e essa ausência é proposital, aumentando a sensação de vazio. É preciso senti-lo, e quanto
melhor você sente, maior sua inserção na angustia que permeia a trama.
Nota: 9,5
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