terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Gloria (2013)

 
 
       Aclamado pela crítica no Festival de Berlin e conquistando importantes prêmios como o Urso de Ouro para melhor Atriz, Gloria, quarto longa-metragem de Sebastián Lelio (La Sagrada Familia, Navidad, El Año del Tigre), chega finalmente às salas de cinema do Brasil.

         Gloria (Paulina Garcia) é uma mulher próxima aos seus 60 anos de idade, separada, independente, de classe média, com filhos adultos e igualmente independentes. Sempre muito bela, alegre e com personalidade forte, ela vive sozinha em um apartamento em Santiago e confronta-se com as vantagens e desvantagens que essa fase da vida pode proporcionar. Em um baile conhece Rodolfo (Sergio Hernández) e começa a viver uma intensa paixão. Tudo vai bem, a não ser pelas incompatibilidades que ambos possuem no trato com seus ex-relacionamentos, bem como com os filhos, tendo impacto profundo na relação. Para piorar, Gloria também é confrontada com as instabilidades comportamentais de Rodolfo, fortemente ligada a difícil relação que possui com seus filhos e ex-esposa.

      A personagem Gloria retrata muito do que há em mulheres (e também homens) de classe média no Chile. Pessoas atentas ao contexto social e político do seu país, mas que deixa para os jovens o papel de cobrar mudanças nas velhas estruturas. Ela e as muitas mulheres e homens de sua idade pensam já terem cumprido o seu papel sociopolítico e tem pela frente o desafio de viver, amar, sentir, divertir-se e combater a solidão que teima em bater a porta. Ioga, bailes, trabalho, encontro com amigos são oportunidades de viver intensamente e, talvez, recomeçar ao lado de um companheiro. Gloria é uma chilena, mas poderia ser uma brasileira, uma colombiana, argentina ou francesa. Trata-se de um sujeito quase universal. Assim, o filme retrata as delícias e dificuldades da vida na chamada “melhor idade” e chama atenção para esse estrato social que emerge fora do clichê “idoso” (com bengalas, cansado da vida e esperando pela morte) e é ainda ignorado pela maioria das pessoas. 

         Gloria é um filme leve, surpreendente, com um toque feminista e divertido. Ainda assim, está longe de ser um entretenimento holywoodiano. É arte fina que comprova uma vez mais a maestria e marca do estilo de Sebastián Lelio, muito preocupado com a vida em movimento, que como as águas de um rio, choca-se contra barreiras, mas continuam o seu percurso ininterrupto rumo ao mar. O espectador deve estar atento às metáforas ao longo do filme, que são extremamente importantes para sua melhor compreensão (o detestado gato do vizinho que teima entrar no apartamento de Gloria, por exemplo, é um personagem fundamental que não deve ser ignorado). Suave, ousado e apaixonante como toda boa poesia, Gloria é um filme que merece ser assistido e principalmente sentido. É impossível também não vibrar com a atuação de Paulina Garcia, um espetáculo à parte em todos os sentidos.

Nota: 9,5

OBS.: O Brasil é bem homenageado por meio das músicas que tocam ao longo do filme, incluindo Tom Jobim. É uma vergonha para os brasileiros que nossos vizinhos sejam tão atentos aos produtos de nossa cultura enquanto nós ainda nos mantemos ignorantes frente a rica cultura hispano-americana.

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